no comboio.

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No comboio, à janela
correm flores e campos verdes
correm nuvens, e corre a vida
como se alguém corresse atrás dela.
No comboio, à janela
tudo é breve, uma miragem.
E correm pés de gente grande
em busca da próxima paragem.

No comboio de quem vai dentro
tudo é vagar, ganha-se ao tempo.
E nesta pausa, neste intervalo
o corpo cobra a sua vontade
o capricho, a necessidade.
No comboio de quem vai dentro
há de tudo como na feira:
uns contam a história do vigário
outros libertam-se em confessionário
com um qualquer desconhecido
que por jeito é ateu.
E há os que se vingam nos livros,
os que são música nos ouvidos.
Os que são desejo, e os que são temor
que outros se sentem à sua beira
e se desdobrem em conversas
sobre política ou amor.
E há ainda os que gritam porque todo o dia é festa.
E os que se rendem, embalados,
ao doce pecado da sesta.

E há ainda aqueles, os estranhos,
que só estão. Qual sentinela,
num silêncio que é só deles
absorvidos, hipnotizados,
por aquela vida que corre
no comboio, à janela.

No comboio, quem diria
vai a paz e vai a guerra.
Vai o tempo, vai-se o tempo
na sua pressa,
no seu vagar,
pouca terra, pouca terra.

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