pessoas normais

Quais são exatamente os requisitos para considerares alguém uma “pessoa estranha”? A forma como se veste? As escolhas que faz? A forma como se comporta? As pessoas com quem (não) se dá?

Normal. Que palavra tão espaçosa esta. Quantas ideias, pressupostos e utopias cabem num único adjetivo. Chega a ser irónico que uma palavra tão espaçosa seja na verdade tão vazia. Vazia, despersonalizada, descaracterizada, volátil, altamente dependente. “Normalidade é um estado padrão, normal, que é considerado correto, sob algum ponto-de-vista. É o oposto da anormalidade. A normalidade muitas vezes se dá por conta de uma maioria em comum, sendo anormal aquele que contraria esta maioria.”

Normal. O selo de garantia que te assegura que te “encaixas” na sociedade. Que tu és quem está bem, e os outros, esses seres raros e diferentes que resistem à curva da normalidade é quem se deve preocupar. Em ser diferente, pensar diferente, escolher diferente. Verdade, é que este não é apenas um “selo” que exibimos com orgulho, é um “selo” que, do conforto de quem o possui, queremos estampar a todo o custo em quem não ambiciona sequer ser “selado”.

Normal. É assim que me sinto em alguns momentos. Momentos suficientes, creio eu, para sentir que me enquadro, que me encaixo, que me permito viver nos sucessivos “normais” que em três décadas já conheci, todos eles gritantemente diferentes, todos eles invariavelmente normais. O normal muda, e as pessoas normais mudam com ele. Agradeço por isso. Não consigo imaginar o que sentirá alguém a quem a camisola do normal nunca serviu. Frustração? Solidão? Paz? Alegria?

Estranha. Diferente. Não normal. É assim que me sinto em alguns momentos. O resultado? Orgulho, gratidão. Por me ter permitido sê-lo, senti-lo. E depois há dias em que tento “normalizar” os que me rodeiam para a necessidade da diferença. Há dias em que não tenho energia e simplesmente não quero saber. Há dias em que me sinto sozinha. Há dias em que quase dá para chorar. Há dias em que dá para rir, fazer humor, ironizar, praticar o sarcasmo.

Normal. Quantos de nós “carregamos” esta necessidade quase inconsciente, de nos identificarmos, de pertencermos? Quanto é que isso faz de nós melhores pessoas? Nada, na minha humilde opinião. Mais adaptadas, sem dúvida. Mais acompanhadas, quem sabe. Mas quão mais perto de nós? Quantas “camadas” conscientes ou inconscientes nos permitimos ainda em prol do conceito de normalidade do momento, da vontade ou necessidade de sermos aceites, ou como “um meio” para um bem maior? Quão perto estamos do que realmente somos ou do que alguém espera que sejamos? Do que nós próprios esperamos ser?

Normal. Hoje dei por mim a pensar: para que serve realmente esta palavra? Seria o mundo um lugar mais fácil e mais bonito de viver se a deixássemos entregue ao seu próprio vazio e abraçássemos verdadeiramente a nossa individualidade, a nossa diferença, e as diferenças dos demais?

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Normal People (2020) é uma série diferente, sobre pessoas (não) normais, com interpretações excecionais dos protagonistas, que me deixou com vontade de ler o livro que lhe serviu de base e ouvir a banda sonora com toda a atenção que merece.

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