desabafo de uma infratora

Sabes que a Polícia Municipal no Porto não tem o trabalho em dia quando recebes em casa, em 2018, a multa de uma infração que cometeste em 2016. Por outro lado, ela tarda mas não falha. Aposto que alguns políticos gostavam que os casos deles fossem tratados com tanta seriedade em tribunal como a que dedicaram a este que tenho em mãos e em débito. Pior que ser “multado”, é ficar neste eterno limbo de ser ou não ser punido, com aquele risco perverso da prescrição.

A primeira vez que o teu carro é rebocado é como o primeiro amor. Tu achas que nunca se esquece. Mas, na verdade, perdem-se alguns detalhes na persistência do tempo que passa. Por exemplo, eu esqueci que afinal só tinha pago o reboque, ainda faltava chegar a multa a casa. E, tal como prometido, ela apareceu. No seu vestido vermelho mais bonito, vulgo carta registada. Deve ter sido por isso que demorou tantos meses, esteve a pôr-se bonita para mim. Não tive coragem de lhe fazer a desfeita, e hoje de manhã fui levantá-la ao posto CTT mais próximo, que – abençoada seja eu – não fica a 10km de minha casa, embora tenha 10km de fila.

2016. Ora, o papa esteve em Fátima em 2017. Será que a minha multa não cumpriu os requisitos de absolvição? Talvez não tenha sido redigida na melhor caligrafia. Talvez o papel devesse ser reciclado. Talvez o meu carro devesse mover-se a água-benta.

Mudando a perspectiva, 2018 está a começar dando-me a oportunidade de fechar um ciclo. E só me pede 30 euros em troca. Podia ser pior, menina infratora. Vamos lá, pagar mais e reclamar menos se faz o favor. Já vou, já vou. Mas antes uma última nota: algo de mal se passa no mundo quando somos multados numa rua que se chama “Felicidade Brown”. Na Rua da Felicidade não devia haver multas. Na verdade, nem devia haver carros. Só se podia andar a pé. Mas sem corridas e trilhos e essas coisas da moda. O mundo está cheio de gente com pressa. Na Rua da Felicidade os ponteiros são preguiçosos. E as pessoas também podem ser, principalmente às segundas-feiras de manhã. A Rua da Felicidade era uma rua bonita para morar, não fosse eu ter sido multada lá. Talvez por isso se chame “Felicidade Brown”. Para avisar as pessoas que é uma felicidade disfarçada. Os mais distraídos lêem Brownie e pensam: “porquê o pleonasmo?”. Mas na verdade é só isso: castanha. Uma Felicidade Castanha que nem para o magusto serve.

Não se deixem enganar. Já dizia o clichê nº 320: “a Felicidade não é um destino, é uma viagem”.

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