Dediquei grande parte do último mês a estudar o céu. Tenho, por isso, algumas cãosiderações que gostava de partilhar convosco.
Sendo muito pragmático e frontal, a pergunta essencial que se coloca é: Porque é que os cães não podem voar? Quem decide o critério?
Aprofundemos a questão:
As nuvens, são fofas, e voam. Aceito.
As moscas, são chatas como as moscas, e voam. Qual é a lógica afinal?
O sol, é amarelo, e voa. Compreendo. Ninguém gosta do amarelo. Quiseram dar um trunfo extra ao sol.
O limão, é ácido, tem casca, tem pevides, e não voa. E ainda o usam para fazer lengalengas para bêbedos. Em que é que ficamos afinal? Um limão? Meio limão?
Mas há mais. Falemos dos gatos, que passam o dia a voar de telhado em telhado. Quantos genes de independência têm eles? Há inclusivamente rumores que o brexit foi ideia de um gato. E o mundo, ainda assim, deu-lhes a independência máxima na categoria de meio de deslocação.
As gaivotas, ainda dou de barato. Aqueles agudos aleatórios repelem qualquer ideia de domesticação. Além disso sofrem de incontinência fecal, que faz com que tropecemos nos seus dejetos mais depressa que num dos controladores de estacionamento dos parquímetros do Porto. Mas é preciso não esquecer que elas têm acesso privilegiado aos contentores do lixo. Já eu, só de chegar perto, sinto-me logo absorvido por um daqueles olhares de reprovação. Não me parece justo.
E depois, há todo o negócio dos aviões. Cruzam os céus a toda a hora e fazem mais barulho que a voz fantasma do metro do Porto (Sim, é verdade, andei pela primeira vez, foi tão assustador como seria expectável para uma atividade radical desta dimensão, sobrevivi, não tenciono repetir. Obrigada por perguntarem. Adrenalina sim, mas de preferência servida no prato, intercalada com cenoura, maçã ou courgette). Este mês, foi vê-los a exibirem-se céu acima, céu abaixo, em jeito de provocação para connosco, criaturas terrestres a quem ninguém deu um dia a escolher o tipo de relação que gostaríamos de manter com a Dona Gravidade.
Até a minha bola de ténis, imagine-se, consegue voar quando lhe dão um incentivo. Não me façam esse olhar, é óbvio que não estou a falar de quando Ele ou Ela a atiram para o ar. Aí até eu voo um bocadinho para a agarrar. O incrível é que mesmo quando a atiram direitinha para o chão, a bandida ergue-se de volta no ar sem me dar tempo de analisar o gesto técnico. E mesmo quando me decido a agarrá-la para lhe amparar a queda, não retorna a gentileza com uma dica que seja. Podia pelo menos dizer-me quem é que a treinou. É que o meu faro diz-me que não me safo com aqueles dois, tendo em conta que as primeiras coisas que me ensinaram foi a sentar e a deitar. Tudo a favor da gravidade, convenhamos. Pergunto-me se ainda vai chegar o dia em que os ouço dizer: “Buddha, voa”. Aí sim, ninguém me apanhava quieto. Era ver-me a entrar para a história como o primeiro cão a sofrer do Síndrome Marcelo.
Até à dúzia,
Buddha.